Artigo Técnico: Crise de talentos: a importância da formação de mão de obra tech no Brasil
Mesmo com inúmeros layoffs acontecendo, o setor de TI (Tecnologia de Informação) segue lidando com a falta de mão de obra qualificada. A escassez de talentos, no Brasil e no mundo, atingiu o seu nível mais alto dos últimos 17 anos, segundo um levantamento realizado pela ManpowerGroup. Ainda conforme a pesquisa, o setor de tecnologia é o mais afetado pela falta de demanda de profissionais capacitados.
Apesar disso, o cenário de TI está em crescimento, e é visível nos dados. Segundo um relatório produzido pela Gartner, os investimentos no setor tech devem chegar a US$ 4,6 trilhões neste ano, representando alta de 5,1% em relação ao ano passado. Os postos de trabalho também seguem em alta, segundo um levantamento produzido pela Cortex. Conforme a pesquisa, em janeiro deste ano eram mais de 33 mil oportunidades em aberto, um aumento de 38% em comparação com o mesmo período de 2022, quando eram pouco mais de 24 mil vagas.
A perspectiva é que a concorrência por profissionais qualificados continue aumentando, assim como o seu custo. Por isso, as empresas do setor precisam aprender a elaborar planos de ação que minimizem essa lacuna. Nesse sentido, trago três provocações para discutirmos:
Será que seu processo de recrutamento e seleção continua realmente efetivo e suficientemente ágil?
Para contratar bem em 2023, é imprescindível que a empresa amplie suas táticas na busca por bons candidatos. Ações combinadas de divulgação de vagas e busca ativa de talentos também são válidas na fase de prospecção, no entanto, ainda é importante incentivar programas de indicação de candidatos, seja pelos próprios funcionários da empresa, conhecidos ou redes de tech recruiters parceiros. Empresas que se utilizam de práticas como essas relatadas acima têm conseguido finalizar processos de R&S em menos de um mês. Como está esse KPI na sua empresa atualmente?
Com que frequência você tem revisitado as condições e benefícios da sua oferta de contratação?
É chegada a hora de pensar diferente, sair do padrão óbvio, e exceder o mínimo regulatório. Pautar sua oferta de trabalho para profissionais de tecnologia digital, em 2023, em regime híbrido ou pacote home office, é ser minimamente atrativo. Mais do que nunca, os talentos buscam planos de desenvolvimento pessoal, de carreira e de promoção corporativa mais objetivos e transparentes. Benefícios flexíveis também são uma tendência. Recentemente começaram a surgir opções de apoio financeiro voltadas para renegociação de dívidas dos colaboradores. E no seu caso, qual o diferencial do seu pacote de remuneração e benefícios?
Quanto alinhados estão os objetivos corporativos com o plano de desenvolvimento dos seus colaboradores?
Em um mundo cada vez mais dinâmico, em que a necessidade de ações de upskilling e reskilling é crescente, o mapeamento estratégico de habilidades (e o consequente gap entre o que seus colaboradores possuem hoje e o roadmap tecnológico planejado para o futuro da organização) torna-se um importante diferencial competitivo.
Diante desse cenário, a formação de profissionais e candidatos tem sido - e deve continuar sendo - o foco das soluções para lidar com a escassez de talentos, visto que, agora, mais do que nunca, as organizações precisam compreender a importância de investir em seus colaboradores. No Brasil, segundo a pesquisa da ManPowerGroup, cerca de 82% das empresas investem nessa alternativa. Em dados globais, a taxa representa 71% das companhias.
Certamente, a contribuição mais significativa para combater o déficit de profissionais em tecnologia é o investimento massivo e colaborativo na capacitação e potencialização de talentos.
Uma máxima que tenho usado bastante ultimamente é "treinar para recrutar melhor, recrutar e treinar para melhorar". Para esclarecer de forma prática, ofereço três prismas sobre a questão:
Invista em treinamentos pré-contratação que funcionem como o seu filtro de seleção e avaliação técnica.
Essa pode ser uma opção valiosa para a empresa se relacionar com o candidato previamente, conhecer o seu desempenho e comprometimento, cultivar confiança para ambos os lados na hora da contratação, além de investir concretamente em employer branding.
Treine e certifique os talentos da casa como parte do plano de promoção e mobilidade internas.
Pesquisas recentes mostram que a prática vale a pena, tanto por motivação e engajamento dos colaboradores quanto da perspectiva de rotatividade. Veja só: segundo uma pesquisa feita pelo LinKedIn na Oceania, funcionários que têm oportunidade de T&D e mobilidade interna tendem a permanecer duas vezes mais tempo na empresa. E de acordo com enquete feita pela consultoria Deloitte, 75% das empresas de alto desempenho priorizam mobilidade interna (contra 37% das empresas de baixa performance).
Capacite os profissionais do mercado que ainda não possuem as habilidades técnicas no nível de proficiência que você procura
Crie oportunidades para o "júnior em tech skills", aqueles talentos que ainda precisam desenvolver hard skills, mas que já contam com a experiência e as soft skills necessárias para entregar os resultados que sua empresa almeja no médio e longo prazos.
Quando o devido valor é atribuído à combinação estratégica de recrutamento e seleção, mapeamento e gestão de competências, e treinamento e desenvolvimento individual, cultivar a relação da sua empresa com as instituições de ensino tradicionais e as edtechs também é uma solução válida. A cooperação multilateral na formação de talentos tech é imprescindível nesse cenário, principalmente por oferecer uma solução mais assertiva às companhias diretamente afetadas pela falta de mão de obra qualificada.
Tendo tudo isso em vista, é importante que as companhias se dediquem a olhar com mais atenção para essas soluções, pois elas estão diretamente relacionadas à manutenção do crescimento e retenção de times de TI, e consequentemente do sucesso dos projetos de transformação digital das empresas, representando o caminho mais inteligente para trilhar rumo a aproveitar as melhores oportunidades geradas por essa percepção mais superficial de crise recente no mercado de tecnologia e inovação.
Por: Paulo Camargo é CRO da iTalents, mestre pela Escola de Negócios Leuphana, fellow em inovação da Academia Real de Engenharia do Reino Unido e alumni do governo alemão para a sustentabilidade. Empreendedor serial, Camargo é professor e consultor nas áreas de inovação, empreendedorismo e modelagem de negócios. É autor do livro “Síntese de divergentes – aprendizagem inspirada em propósito” e empreendedor destaque na última edição da revista francesa Entrepreneurial Mindset Network
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